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A Educação que muda rumos: de Guiné-Bissau até o título de mestre na UFFS

Manga Sané é o primeiro imigrante mestre em Educação pela UFFS - Campus Chapecó

Assessoria de Comunicação - Campus Chapecó — 28 de Abril de 2025 — Atualizado em 28/04/2025

A Educação que muda rumos: de Guiné-Bissau até o título de mestre na UFFS

Sané viveu intensamente o período do mestrado, inclusive indo à Alemanha para a apresentação de trabalhos

No Dia da Educação, 28 de abril, a comunidade acadêmica comemora o primeiro mestre imigrante pela UFFS – Campus Chapecó. Para além disso, o bissau-guineense Manga Sané é mestre – justamente - em Educação. E sua trajetória é uma verdadeira aula.

Conseguir uma vaga em uma universidade federal, enfrentar dificuldades financeiras e atravessar um oceano para estudar. O caminho de Sané inclui tudo isso e mais: a travessia do Nordeste para o Sul do Brasil, a conquista do título de mestre e o nascimento de filhos gêmeos. 

Sané finalizou mestrado há pouco tempo. Depois das correções e alterações sugeridas pela banca na dissertação, ele deseja um trabalho na área ou seguir os estudos, em um doutorado. 

Ele veio ao Brasil buscando uma graduação. Segundo ele, em Guiné-Bissau não seria possível estudar, já que as universidades por lá têm mensalidades fora das possibilidades financeiras dele e da família. A primeira parada de Sané foi o Ceará, para cursar Letras na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). 

Com esforço e uma bolsa de estudos, ele conseguiu se formar. Participou do processo seletivo do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFFS logo depois, quando estava na expectativa da vinda da esposa, Mariama Jau, para o Brasil.

A notícia da aprovação chegou ao mesmo tempo de Mariama. Ela aceitou a mudança e incentivou o marido para aproveitar a oportunidade. O conselho também veio do amigo que dividia a casa com Sané: “ele me disse que eu deveria arriscar, porque a oportunidade às vezes aparece somente uma vez”.

O receio era a questão financeira. Durante a graduação, além de receber auxílio, ele teve bolsas Pibid e de Residência Pedagógica. Apesar dos valores serem restritos, Sané conta que foi guardando pequenos valores ao longo dos anos, o que o ajudou a pagar as passagens e conseguir alugar uma casa em Chapecó.

Porém, com um custo de vida mais alto no Sul, e com dinheiro restrito, ele seguia muito preocupado. Conforme conta, foram três ou quatro meses em Chapecó sem renda. Porém, depois ele conseguiu uma bolsa para seguir os estudos.

Com muito estudo e dedicação, ele continuou o mestrado e sua pesquisa “A performance da política educacional na literatura guineense de 1975 a 2022: uma análise à preponderância assentada nas obras de Abdulai Sila, Costa e Semedo”. A visita à família, em seu país de origem, ficava para depois. Em meio a tantas dificuldades e muitos estudos, Sané perdeu seu pai, que seguia em Guiné-Bissau. Os planos mudaram e ele solicitou aos professores do PPGE para ir a seu país. Superando mais uma vez a dificuldade financeira, esteve com seus entes naquele momento de tristeza.

A motivação para se tornar mestre, entretanto, continuou. Três meses depois, ele conseguiu ir para a Alemanha para a apresentação de três trabalhos em um evento científico.

Já no Brasil, ele e a esposa descobriram que estavam à espera de um bebê. Alguns meses depois, porém, tiveram uma surpresa: eram dois bebês. Felicidade e preocupação se mesclaram na mesma intensidade. Para sustentar a família, que logo teria seu número dobrado, Sané buscou um emprego e, por algum tempo, atuou em um frigorífico concomitantemente à realização do mestrado.

Depois da banca e das correções no trabalho, Sané, incentivado pela orientadora, professora Camila Caracelli Scherma, busca um emprego na área. “Quero continuar ativamente nas pesquisas. Se conseguir, quero também fazer doutorado”, finaliza ele.



O que conta a orientadora de Sané, professora Camila Scherma 

- Como foi a trajetória do agora mestre durante o curso?

Desde o processo seletivo que ele prestou para ingressar no Programa de Pós-Graduação em Educação, ele demonstrava bastante clareza daquilo que gostaria de pesquisar, daquilo que gostaria de compreender a partir do percurso da pesquisa que ele iria realizar. Ele ainda estava no Ceará nessa época do processo seletivo, e, quando chegou aqui, foi demonstrando essa clareza também na prática, cursando todas as atividades propostas pelo programa, todas as atividades curriculares e extracurriculares também, participando de todas as reuniões do grupo de pesquisa que ocorreram no período em que ele estava desenvolvendo a pesquisa de mestrado. 

E também, além de fazer tudo aquilo que era proposto pelo programa, pelo currículo do programa, ele também demonstrava bastante maturidade em relação à pesquisa, uma vez que sempre propôs coisas para além daquilo que era o mínimo necessário para a sua formação. Já no primeiro semestre, se eu não estou enganada, da presença dele aqui, ele inscreveu um trabalho e foi aprovado na cidade de Humenau, na Alemanha, de total autoridade sobre aquilo que ele estava fazendo, e ele só me comunicou que já havia sido aprovado e que o trabalho dele já tinha sido aceito na Alemanha. E então, ele fez essa viagem, utilizando-se de todos os recursos necessários para que ele conseguisse custear essa viagem, e passou uma semana na Alemanha, interagindo com pesquisadores de várias partes do mundo, e fez isso como um representante do Brasil, apesar de ser guinense. E isso é muito interessante.

Isso não se descola do sujeito que ele é. E nessa época também foi pessoalmente difícil para ele, porque perdeu o pai. Ele estava há alguns anos sem ver o pai, e um pouco antes desse congresso na Alemanha, soube da notícia do falecimento do pai, que estava na Guiné-Bissau. Sané fez uma viagem à Guiné-Bissau para visitar a família, para estar com os seus, nesse momento bastante difícil. E além disso, mesmo assim, nesse momento de dor, ele ainda utilizou o seu tempo na Guiné-Bissau para conseguir levantar dados para a pesquisa dele, com os quais ele trabalhou depois ao longo da dissertação.

Então, se eu pudesse resumir a trajetória dele, seria essa. Uma trajetória muito clara em relação àquilo que ele estava fazendo como pesquisador, e com bastante autonomia, demonstrando muita autonomia como pesquisador, fazendo seus trabalhos, escrevendo artigos, enviando para as revistas, participando de todas as atividades, e sem deixar de conciliar aquilo que ele considera a sua essência, que são os cuidados com a família, a presença com a família, mesmo diante das mais diversas dificuldades. Então, a trajetória do Manga Sané é uma trajetória exemplar para aquilo que a gente entende que é a constituição de um sujeito pesquisador.

- Os orientadores - como o nome bem diz - encaminham, orientam os mestrandos. Mas o que essa orientação trouxe a você enquanto docente?

Essa é uma questão que trabalha aquilo que a gente entende por ser docente e, nesse caso da pós-graduação, uma docente pesquisadora que está formando outros docentes pesquisadores. Cada orientação que a gente desenvolve é única, singular e irrepetível. Portanto, todas elas têm a sua força, a sua beleza, as suas dores e o seu alargamento dos horizontes de possibilidades de compreensão de mundo, que é o que a gente faz na pesquisa.

Em relação a esta orientação especificamente, por ser um estudante oriundo de uma outra cultura, de um outro continente, de um outro país, esse alargamento acontece de formas diversas, porque diz respeito a um lugar de alteridade com diferenças um pouco maiores do que as diferenças que nós encontramos com estudantes da nossa mesma cultura. E, por isso, tão rica, por conta dessas diferenças culturais e por conta também de tudo aquilo que esse estudante em particular trouxe para o nosso universo da pesquisa. O quanto a gente teve que buscar, aprender, trazer, olhar a nossa própria língua com outros olhos, porque nós somos falantes da língua portuguesa, Manga Sané também é falante da língua portuguesa. É uma das línguas que ele fala, ele é da etnia fula e ele fala crioulo e fala inglês como língua estrangeira e fala o português como a língua dos colonizadores.

Essa foi uma grande percepção que essa orientação me trouxe, olhar para a nossa própria língua com outros olhos, porque nós também falamos o português por conta dos nossos colonizadores, mas me parece que isso ficou um pouco mais diluído na história. Enquanto que na Guiné-Bissau essa questão do português ser a língua do colonizador me parece ser ainda muito forte e muito determinante da forma como ele enxerga o mundo a partir da língua portuguesa. Eu sou, enquanto pesquisadora, bastante interessada também nas literaturas, e essa pesquisa em especial me trouxe literaturas que eu não conhecia, literaturas que eu li ao longo do processo da pesquisa e literaturas que também alargaram os meus horizontes de possibilidades de compreensão do mundo.

Então, apesar de cada orientação, cada pesquisa trazer sempre algo novo, algo diferente, porque o que não é da dimensão da identidade é da dimensão da alteridade, é o outro como centro de valor. As diferenças aqui são de ordens diversas em função das culturas que se relacionam através dessa pesquisa, das literaturas que se relacionam e da forma de se organizar a educação pública, que apresenta diferenças bastante consideráveis do que nós brasileiros entendemos como educação pública e do que os guineenses têm entendido como educação pública.

Reforço aqui o quanto nós, orientadores, aprendemos com os nossos orientandos. E essa é uma dimensão muito importante, porque no processo de formação de um mestre, que é a relação que se estabelece aqui, no processo de formação de um professor mestre, e um professor mestre em educação, nós, orientadores, também nos constituímos, nós também nos formamos.

Acho que essa pesquisa, como em outras também, demonstrou que é preciso estar atento, é preciso se colocar à escuta, uma escuta fina, uma escuta sofisticada, uma escuta detalhada, uma escuta extremamente atenta das questões que se colocam nas relações humanas. Esse trabalho me mostrou que é preciso estar sempre à escuta. E estar à escuta não é uma atividade passiva, e sim uma atividade ativa, de atividade.

Então é preciso estar sempre em atividade, olhando para os diversos pedaços de mundo que a gente se propõe a compreender, porque no fundo, no fundo é isso. Orientar, pesquisar, escrever sobre as pesquisas com os dados que temos em mãos, é a gente se colocar à escuta de diferentes pedaços de mundo que a gente se propõe a compreender. E essa pesquisa me trouxe compreensões acerca de um pedacinho da África, mas que nos mostra a grande diversidade e a potência que a gente tem nessas relações de escuta acadêmica através da pesquisa.


A pesquisa de Sané 

Título: “A performance da política educacional na literatura guineense de 1975 a 2022: uma análise à preponderância assentada nas obras de Abdulai Sila, Costa e Semedo” 

A Guiné-Bissau é um país africano, oficialmente República da Guiné-Bissau, situa-se na costa ocidental da África, e possui o clima equatorial. A Guiné é um país quente, com uma média, mais ou menos de 33º graus de temperatura em determinados meses, ainda assim, com a sua floresta úmida. Geograficamente, a Guiné possui fronteira com o Senegal na zona Norte do país, Sul e Oeste pelo Oceano Atlântico, ao sul do país com Guiné-Conacri, extensão 36.125 km².

A língua oficial é o português, mas sempre que é possível, os que têm o privilégio de ter acesso à escola normalmente aprende falar e escrevê-la nas escolas, apesar que é um país pequeno, mas a Guiné é um país multilíngue, pluri étnico e laico. A população é estimada em aproximadamente 2,153 milhões de habitantes. A Guiné adquiriu a sua independência através da luta armada contra os colonizadores portugueses. A luta que durou 11 anos, com a independência do país no dia 24 de setembro de 1973.

Entretanto, o país não se consolidou por causa de sucessivos golpes de estado. O sistema assolou o país a não consolidar com as suas políticas educacionais e reconhecimento culturais para os seus cidadãos. Nesse sentido, o trabalho de Sané tem como a meta principal compreender a hegemonia cultural europeia nas escolas da Guiné-Bissau através do estudo das políticas educacionais e da literatura guineense.

A pesquisa debruça-se nos estudos bibliográficos, e trata dos autores que um momento ou noutro discutiram na área de políticas educacionais. O uso das línguas étnicas são proibidos nos recintos escolares desde o governo Guiné-Portuguesa; também é importante perceber que na educação de cada país, existem entidades que controlam os materiais didáticos que são permitidos ao uso coletivo nas escolas nacionais que se chama superestruturas segundo Gramsci (2013, p. 25). Durante a colonização, o governo português exterminou tudo o que era de valor cultural para fora de sala de aula, e, também, que restringe à literatura guineense nos materiais didáticos. Neste contexto, o trabalho pretende acender a luz da verdade, entre a sociedade guineense, aliás, sobre os estudantes e os professores, procurando saber que traços culturais ficam fora de sala de aula. A menos, para que exista a representação da realidade cultural e educativa do país na literatura guineense; assim, permitindo aos cidadãos vislumbrar a contribuição que os escritores oferecem à acerca da mesma. 

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